
Numa dessas manhãs encontrei com um amigo, como de costume. O papo surgiu quando eu tive que explicar que a noite não foi tranqüila, pois tive mais uma daquelas insônias. Falamos, então, de medicamentos pra dormir, apesar de eu não considerar interessante o uso de qualquer tipo de substância para me obrigar a dormir.A conversa se estendeu e, não sei por que razão, chegou a uma frase de caminhão, erudita demais para os padrões utilizados tradicionalmente nas traseiras dos caminhões que rodam este país. Como aquela frase, tão intensa e racional, poderia estar naquele caminhão? Geralmente as mensagens são machistas, elementares e pouco sofisticadas. Mas aquela era diferente, e mexeu com meu amigo. Mexeu com ele e comigo também para dizer a verdade. “A Posse é o Túmulo do Desejo”. Não precisou de dois segundos para eu entender tudo. É claro que é óbvio, mas confesso que é estranho reconhecer uma verdade numa frase de traseira de caminhão. Uma verdade quase absoluta. Eu e meu amigo concordamos com a frase e com nós mesmos. É incontestável o excitante sabor do desejo, do desafio de se conquistar alguém. O problema é que, como analisa Freud, um desejo sempre acaba quando tomamos posse do alvo da aspiração. Na verdade, é isso mesmo... “um desejo” acaba, mas “o desejo” não. Este dura para sempre, o que desaparece é aquele propósito, a paixão por aquilo que se busca alcançar. E esse sentimento é que aflige, decepciona, nos derruba. Entendemos então que é esse mistério, o mistério do desejo, que nos transforma em pessoas indiscutivelmente predestinadas a correr sempre atrás de um novo desejo, uma nova razão para pulsar.

4 comentários:
Confesso que nem eu havia pensado nessa verdade absoluta. Para mim, ela cai como uma luva. Muito bom mesmo.
Bem legal...gostei muito do texto!!! Vê se escreme mais por aqui...esse daí é do mês passado.
Vê se escreve direito...
Oi Alcione,
Muito legal o contraponto que voce usa entre a profundidade da mensagem e o meio que foi usado para sua divulgação.
A questão da veracidade do seu conteúdo, é indiscutível e seu ponto de vista é muito legal.
Já a maneira em que a frase aparece pode ilustrar a infinidade de outras oportunidades pedidas por não se estar atento ou por não creditar ao meio a possibilidade de um saber com menos preconceito e mais "substância". Faço aqui uma mea culpa também.
Abraço, Lamartine.
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