
Numa dessas manhãs encontrei com um amigo, como de costume. O papo surgiu quando eu tive que explicar que a noite não foi tranqüila, pois tive mais uma daquelas insônias. Falamos, então, de medicamentos pra dormir, apesar de eu não considerar interessante o uso de qualquer tipo de substância para me obrigar a dormir.A conversa se estendeu e, não sei por que razão, chegou a uma frase de caminhão, erudita demais para os padrões utilizados tradicionalmente nas traseiras dos caminhões que rodam este país. Como aquela frase, tão intensa e racional, poderia estar naquele caminhão? Geralmente as mensagens são machistas, elementares e pouco sofisticadas. Mas aquela era diferente, e mexeu com meu amigo. Mexeu com ele e comigo também para dizer a verdade. “A Posse é o Túmulo do Desejo”. Não precisou de dois segundos para eu entender tudo. É claro que é óbvio, mas confesso que é estranho reconhecer uma verdade numa frase de traseira de caminhão. Uma verdade quase absoluta. Eu e meu amigo concordamos com a frase e com nós mesmos. É incontestável o excitante sabor do desejo, do desafio de se conquistar alguém. O problema é que, como analisa Freud, um desejo sempre acaba quando tomamos posse do alvo da aspiração. Na verdade, é isso mesmo... “um desejo” acaba, mas “o desejo” não. Este dura para sempre, o que desaparece é aquele propósito, a paixão por aquilo que se busca alcançar. E esse sentimento é que aflige, decepciona, nos derruba. Entendemos então que é esse mistério, o mistério do desejo, que nos transforma em pessoas indiscutivelmente predestinadas a correr sempre atrás de um novo desejo, uma nova razão para pulsar.



