Engraçado como tudo é maior e mais bonito quando se é criança.
Ela o observava pelo intervalo que ficava entre uma ripa e outra de madeira.
Ele chegava todos os dias no mesmo horário, subia as escadas, abria a porta, sentava no banquinho, tirava os sapatos, as meias, a camisa e as calças.
Andava de um lado para o outro, abria a geladeira, tomava água, comia algo.
Deitava no sofá como um rei.
Era grande, forte, barba por fazer, cabelos negros cacheados.
Tão bonito, tão alto, tão homem.
E ela lá, fitava cada passo, cada gesto, como se decorasse uma coreografia.
Era excitante observar aquilo tudo.
E o melhor, ele não a via. Isso era o melhor!
Era inevitável procurar todos os dias o melhor ângulo, a melhor fresta.
Tudo para ver a melhor posição, o melhor enquadramento.
A menina curiosa cresceu e, um dia, observou o homem que há tempos não reparava.
Já não era tão alto, nem tão bonito...
Ela cresceu e, como por encanto, o encanto acabou.
sexta-feira, 7 de maio de 2010
O calo doído do meu pé
O amanhecer tarda a chegar
O laço do vestido lilás
Tornou-se o nó da negra gravata
E as expedições vieram anunciar
Um deles há de chegar
Ele sabia
As borboletas voaram em vão
E a primavera ainda não chegou
A casinha ainda é a mesma
Missões hão de partir
Vidas também
Mas o cenário modifica-se a cada cena
Místicas eram suas asas incessantes
Maldoso o sol que as detia
E aquele ronco silencioso do seu carro
continua diferindo do calo doído do meu pé
O laço do vestido lilás
Tornou-se o nó da negra gravata
E as expedições vieram anunciar
Um deles há de chegar
Ele sabia
As borboletas voaram em vão
E a primavera ainda não chegou
A casinha ainda é a mesma
Missões hão de partir
Vidas também
Mas o cenário modifica-se a cada cena
Místicas eram suas asas incessantes
Maldoso o sol que as detia
E aquele ronco silencioso do seu carro
continua diferindo do calo doído do meu pé
Diferentes
O mesmo homem que ceifou esta, ceifou aquela semente
Nutriram-se de água todas as irmãs
O sol tocou no chão de todos
Mas a justiça falhou desde o princípio
Somos gêmeos nas diferenças
Nem todo solo é igual
Nutriram-se de água todas as irmãs
O sol tocou no chão de todos
Mas a justiça falhou desde o princípio
Somos gêmeos nas diferenças
Nem todo solo é igual
Solitários
Diálogos solitários
Imaculada personagem do teatro
Alguns míseros trocados eram pagos
Retinha-os em suas mãos úmidas e grossas
Inconsequência insana
Eternos filhos da loucura
Essa lucidez
Nenhum partícipe da desordem social alcançará
Imaculada personagem do teatro
Alguns míseros trocados eram pagos
Retinha-os em suas mãos úmidas e grossas
Inconsequência insana
Eternos filhos da loucura
Essa lucidez
Nenhum partícipe da desordem social alcançará
Passagem
É menino...
Aquele trem passou
Suas pernas sem firmeza
Seus braços sem ação
O medo da solidão não o deixou só
Sonhos espalhados pelo chão
O berço que o criou agora partiu
O choro não foi importante
A princesa dos óculos se foi
A voz ainda cerca meus ouvidos
A pureza ainda existe
Mas o choro nunca mais voltou
Talvez por não ter força de caminhar até aqui
Aquele trem passou
Suas pernas sem firmeza
Seus braços sem ação
O medo da solidão não o deixou só
Sonhos espalhados pelo chão
O berço que o criou agora partiu
O choro não foi importante
A princesa dos óculos se foi
A voz ainda cerca meus ouvidos
A pureza ainda existe
Mas o choro nunca mais voltou
Talvez por não ter força de caminhar até aqui
sexta-feira, 4 de janeiro de 2008
Perdas Necessárias
Já tinha lido esse livro, de Judith Viorst, há alguns meses... porém, ao folheá-lo novamente, durante esses feriados de fim de ano, encontrei um trecho que considero bastante interessante e, decidi compartilhá-lo com vocês...
“As perdas que enfrentamos quando nos vemos face a face com o fato do qual não podemos fugir...
Que nossa mãe vai nos deixar, e que nós vamos deixá-la;
Que o amor de nossa mãe jamais será só nosso;
Que as dores que nos machucam nem sempre desaparecem com um beijo;
Que estamos no mundo essencialmente por nossa conta;
Que teremos de aceitar - nos outros e em nós mesmos - um misto de amor e ódio, de bem e de mal;
Que, por mais sábia, bela e encantadora que seja, nenhuma garota pode se casar com o pai quando crescer;
Que nossas opções são limitadas pela anatomia e pela culpa;
Que há falhas em qualquer relacionamento humano;
Que nosso status neste planeta é implacavelmente efêmero;
E que somos completamente incapazes de oferecer a nós mesmos ou aos que amamos qualquer forma de proteção contra nossas perdas necessária.
Essas perdas são parte da vida - universais, inevitáveis, inexoráveis. E essas perdas são necessárias porque para crescer temos de perder, abandonar e desistir”.
“As perdas que enfrentamos quando nos vemos face a face com o fato do qual não podemos fugir...
Que nossa mãe vai nos deixar, e que nós vamos deixá-la;
Que o amor de nossa mãe jamais será só nosso;
Que as dores que nos machucam nem sempre desaparecem com um beijo;
Que estamos no mundo essencialmente por nossa conta;
Que teremos de aceitar - nos outros e em nós mesmos - um misto de amor e ódio, de bem e de mal;
Que, por mais sábia, bela e encantadora que seja, nenhuma garota pode se casar com o pai quando crescer;
Que nossas opções são limitadas pela anatomia e pela culpa;
Que há falhas em qualquer relacionamento humano;
Que nosso status neste planeta é implacavelmente efêmero;
E que somos completamente incapazes de oferecer a nós mesmos ou aos que amamos qualquer forma de proteção contra nossas perdas necessária.
Essas perdas são parte da vida - universais, inevitáveis, inexoráveis. E essas perdas são necessárias porque para crescer temos de perder, abandonar e desistir”.
sábado, 29 de setembro de 2007
“A posse é o Túmulo do Desejo”

Numa dessas manhãs encontrei com um amigo, como de costume. O papo surgiu quando eu tive que explicar que a noite não foi tranqüila, pois tive mais uma daquelas insônias. Falamos, então, de medicamentos pra dormir, apesar de eu não considerar interessante o uso de qualquer tipo de substância para me obrigar a dormir.A conversa se estendeu e, não sei por que razão, chegou a uma frase de caminhão, erudita demais para os padrões utilizados tradicionalmente nas traseiras dos caminhões que rodam este país. Como aquela frase, tão intensa e racional, poderia estar naquele caminhão? Geralmente as mensagens são machistas, elementares e pouco sofisticadas. Mas aquela era diferente, e mexeu com meu amigo. Mexeu com ele e comigo também para dizer a verdade. “A Posse é o Túmulo do Desejo”. Não precisou de dois segundos para eu entender tudo. É claro que é óbvio, mas confesso que é estranho reconhecer uma verdade numa frase de traseira de caminhão. Uma verdade quase absoluta. Eu e meu amigo concordamos com a frase e com nós mesmos. É incontestável o excitante sabor do desejo, do desafio de se conquistar alguém. O problema é que, como analisa Freud, um desejo sempre acaba quando tomamos posse do alvo da aspiração. Na verdade, é isso mesmo... “um desejo” acaba, mas “o desejo” não. Este dura para sempre, o que desaparece é aquele propósito, a paixão por aquilo que se busca alcançar. E esse sentimento é que aflige, decepciona, nos derruba. Entendemos então que é esse mistério, o mistério do desejo, que nos transforma em pessoas indiscutivelmente predestinadas a correr sempre atrás de um novo desejo, uma nova razão para pulsar.
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